Pesquisa do WIS: Imunidade interrompida no cérebro do feto e o desenvolvimento neurológico.

Michal SchwartzIdo AMitAs descobertas do Instituto Weizmann feitas em camundongos podem ajudar a explicar como uma infecção viral durante a gravidez pode aumentar o risco de autismo e esquizofrenia na descendência.Microglia1

A interrupção do desenvolvimento do sistema imunitário fetal, como aquela causada por infecção viral da mãe, pode ser um fator fundamental no surgimento futuro de certas desordens a nível do desenvolvimento neurológico. Esta descoberta surge de um estudo do Instituto Weizmann, publicado na revista científica Science de 23 de Junho.
O estudo pode explicar, para além de outras coisas, como a infecção materna por citomegalovírus (CMV) durante a gravidez, que afeta tanto seu sistema imunológico como o de seu feto, aumenta o risco de que a descendência venha a desenvolver autismo ou esquizofrenia, algumas vezes muitos anos depois. Este aumento de risco de doenças a nível do desenvolvimento neurológico foi descoberto muitos anos atrás, em estudos epidemiológicos, e confirmado em modelos de camundongos. O estudo do Instituto Weizmann, liderado pelo Dr. Ido Amit e pela Prof. Michal Schwartz, dos departamentos de Imunologia e Neurobiologia, respectivamente, fornece uma possível explicação para este aumento nos níveis celulares e nos mecanismos moleculares.
“Estudos anteriores mostraram que o momento em que ocorre esta interrupção no sistema imunitário da mãe durante a gravidez é que vai determinar o tipo de dano cerebral que a criança poderá desenvolver. Por exemplo, uma infecção viral no início da gravidez aumenta o risco de autismo, enquanto uma infecção no final da gravidez aumenta o risco de esquizofrenia”, disse Amit. “Nos empenhamos em estudar os mecanismos por trás deste fenômeno, ao mesmo tempo em que nos focávamos no papel que o sistema imunitário desempenha no desenvolvimento cerebral”.
Orit Matcovitch-Natan, uma estudante de pós-graduação nos laboratórios de Amit e de Schwartz, juntamente com outros membros de ambas as equipes, estudou as únicas células imunitárias presentes no cérebro, chamadas de micróglias, que contribuem para o desenvolvimento e manutenção do cérebro. Os cientistas descobriram que o desenvolvimento dessas células no feto do camundongo e nos camundongos recém-nascidos acontece em três estágios distintos, paralelos aos do desenvolvimento cerebral: as células iniciais que populam o cérebro do embrião pouco depois de sua concepção, as pré-micróglias e as células adultas. Através do rastreio do genoma dessas células e de testes abrangentes, os cientistas foram capazes de definir cada estágio em termos de seus genes ativados, seus mecanismos de controle e características epigenéticas, ou seja, a ativação das proteínas que “empacotam” o DNA e afetam a expressão genética durante o desenvolvimento. Os cientistas também caracterizaram as funções de alguns destes genes na micróglia, o que contribuiu para um entendimento mais profundo do processo de desenvolvimento.
O segundo estágio, o da pré-micróglia, mostrou-se o mais sensível à interrupção. Este estágio acontece próximo e pouco depois ao nascimento, quando o cérebro em desenvolvimento passa pelo processo vital de “poda”, no qual sinapses inapropriadas entre neurônios são desbastadas. A pré-micróglia exerce um papel importante na poda, ajudando a remover as conexões desnecessárias entre neurônios, remodelando e fortalecendo as conexões entre os neurônios restantes. Quando os cientistas expuseram os cérebros de camundongos fêmea grávidas a materiais sintéticos que simulam uma infecção por CMV, verificaram que o desenvolvimento da pré-micróglia foi interrompido nos seus recém-nascidos. Os genes envolvidos na maturação dessas células expressaram-se no momento errado, e as mesmas avançaram para um estágio adulto mais cedo que o usual. Seus filhotes, mais tarde, exibiram um comportamento anormal, incluindo perturbações nas interações sociais e comportamentos parecidos àqueles de pessoas com esquizofrenia.
“Descobrimos que é essencial para o desenvolvimento das células imunológicas no cérebro que este desenvolvimento aconteça sincronizado com o desenvolvimento do próprio cérebro”, diz Schwartz. “Uma mudança prematura da micróglia em camundongos para o estágio adulto leva a um mau funcionamento do cérebro, posteriormente”. Apesar de estas descobertas terem sido obtidas em camundongos, os cientistas lançam a hipótese de que a interrupção da coordenação entre o desenvolvimento da micróglia e do resto do cérebro contribui para o aumento do risco de tais desordens no desenvolvimento neurológico, como autismo e esquizofrenia em seres humanos. Os cientistas acreditam que a elevada resposta imunológica à infecção viral no corpo da mãe pode ser responsável pela interrupção do cronograma do desenvolvimento da micróglia.
“Nossa pesquisa criou o caminho para o estudo dos efeitos de outros vírus no sistema imunológico da mãe, em geral, e no desenvolvimento do cérebro de sua cria. Também pode levar a um avanço significativo no estudo de desordens a nível de desenvolvimento neurológico e suas relações com o sistema imunitário”, diz Orit Matcovitch-Natan.
Já em outra série de experiências, os cientistas do Weizmann estabeleceram uma conexão entre o desenvolvimento da micróglia no cérebro dos camundongos e micróbios intestinais, o microbioma. Eles descobriram que os camundongos recém-nascidos que não tinham tais micróbios tiveram uma maturação da micróglia atrasada. Esta descoberta sugere que, em bebês humanos, fatores naturais que modelam o microbioma, tais como a amamentação, ou fatores terapêuticos, como antibióticos, podem afetar as células imunitárias no cérebro do bebê e consequentemente o desenvolvimento do cérebro. Ainda não se sabe em qual extensão esta pesquisa, conduzida em camundongos, é relevante aos seres humanos, mas os cientistas esperam que uma melhoria no entendimento deste processo possa, no futuro, ajudar a prevenir certas desordens neurológicas em bebês, causadas pela interrupção do sistema imunitário materno.
Fazem parte deste estudo a Dra. Deborah R. Winter, Amir Giladi, Eyal David e Dra. Hadas Keren-Shaul, assim como Dr. Eran Elinav e Christoph Thaiss do Departamento de Imunologia, e Hila Ben-Yehuda, Merav Cohen e Dr. Kuti Baruch do Departamento de Neurobiologia. Matcovitch-Natan e Amit Spinrad, também estudante de pós-graduação, pertenceram a ambos os departamentos. Entre os estudantes participantes também se inclui o Prof. Michael H. Sieweke do Centre National de la Recherche Scientifique, França.

A pesquisa do Dr. Ido Amit é apoiada pelo Benoziyo Endowment Fund for the Advancement of Science; David and Fela Shapell Family Foundation INCPM Fund for Preclinical Studies; Wolfson Family Charitable Trust; Leona M. and Harry B. Helmsley Charitable Trust; e pelo Rosenwasser Fund for Biomedical Research. Dr. Amit é o responsável pela cátedra Desenvolvimento de Carreira de Alan and Laraine Fischer.

A pesquisa do Prof. Michal Schwartz tem o apoio de Sonia T. Marschak, Lincolinwood, IL; Elaine Petchek, Scarsdale, NY; Nathan and Dora Oks, France; e Hilda Namm, Larkspur, CA. Prof. Schwartz é o responsável pela cátedra de Neuroimunologia de Maurice and Ilse Katz.