Cerebro

Espectro autista: avanço na compreensão das “inferências” no cérebro social

  Espectro autista:  avanço na compreensão das “inferências” no cérebro social 

 

Cientistas do Weizmann fizeram um grande avanço na compreensão do funcionamento do cérebro, o que no futuro, pode permitir encontrar maneiras de mudar o comportamento nas pessoas com o transtorno do espectro autista.

Pouco se sabe sobre como são codificadas as informações sociais no córtex pré-frontal, a parte do cérebro que utilizamos para entender as necessidades e emoções dos outros. Os pesquisadores Tal Tamir e Dana Rubi Levy (foto) do Departamento de Neurobiologia, decidiram testar a forma como os animais processam informações sociais usando o olfato. Os odores são o meio de comunicação dos camundongos, e mediante eletrodos os cientistas estudaram com precisão como os cérebros respondiam a diferentes odores.

 Primeiro descobriram que a resposta no córtex pré-frontal, era muito mais forte quando os ratos cheiravam outros ratos do que quando eram expostos a qualquer outro cheiro, como manteiga de amendoim, banana ou grama recém-cortada. Nessa área, as respostas “sociais” envolveram cerca do dobro de neurônios daqueles que respondem a alimentos ou grama. Ferramentas computacionais desenvolvidas no Weizmann permitiram descobrir configurações de redes de neurônios que codificavam odores como “vocábulos” que representam estímulos sociais ou não sociais.

Ferramentas computacionais desenvolvidas no Weizmann permitiram descobrir configurações de redes de neurônios que codificavam odores como “vocábulos” que representam estímulos sociais ou não sociais.

No estudo publicado na revista Nature Neuroscience mostraram não apenas como os neurônios no córtex pré-frontal de camundongos distinguem entre estímulos sociais e não sociais, e ainda revelaram como os cérebros de ratos “autistas” não conseguem distinguir adequadamente entre os dois.

Expostos a esses cheiros pela segunda vez, os animais foram muito rápidos para aprender que era o que. O grupo repetiu seus experimentos com camundongos geneticamente modificados para ter mutações associadas ao autismo, e os neurônios desses ratos não distinguiam entre os aromas de outros camundongos e os odores não sociais, e também não melhoraram com a exposição repetida. De fato, na comunicação entre células nervosas havia muito mais variabilidade espontânea, como se houvesse “interferência” na linha.

 Os cientistas acreditam que esses resultados podem ser relevantes para entender o transtorno e no futuro, encontrar maneiras de reduzir a “interferência na linha” e levar a mudanças comportamentais em pessoas com transtorno do espectro autista.

Leia mais: Social Life Neuron

Respire fundo antes de responder!

Respire fundo antes de responder!

A função cognitiva estaria associada à inalação. Pacientes que solucionaram problemas enquanto inalavam se saíram melhor nos testes do que as que exalavam na mesma situação.

Um café expresso, uma barrinha de chocolate ou ficar em posição invertida – todos esses recursos foram recomendados antes de se submeter a um teste expressivo. O melhor conselho, entretanto, poderia ser apenas respirar fundo. Conforme a pesquisa conduzida no laboratório do Prof. Noam Sobel, do Departamento de Neurobiologia do Instituto Weizmann de Ciências, as pessoas que inalam quando se veem diante de uma tarefa visual-espacial se saíram melhor do que as que exalavam na mesma situação. Os resultados do estudo, que foram publicados na revista Nature Human Behavior, sugerem que o sistema olfativo pode ter moldado a evolução da função cerebral muito além da função do olfato.

O Dr. Ofer Perl, que liderou a pesquisa como estudante de graduação do laboratório de Sobel, explica que o olfato é o sentido mais antigo: “Até mesmo as plantas e bactérias podem ‘farejar’ as moléculas em seu ambiente e reagir. Mas todos os mamíferos terrestres sentem cheiros inalando o ar pelos canais nasais e repassando os sinais por nervos até o cérebro.”

Algumas teorias sugerem que esse antigo sentido definiu o padrão para o desenvolvimento de outras partes do cérebro. Ou seja, cada sentido adicional evoluiu utilizando o modelo que havia sido estabelecido anteriormente pelos sentidos já existentes. A partir daí, surgiu a ideia de que a inalação, por si só, pode preparar o cérebro para adquirir novas informações – na essência, sincronizando os dois processos.

Na verdade, estudos dos anos 40 e posteriores já haviam descoberto que as áreas do cérebro envolvidas no processamento dos cheiros – consequentemente, da inalação – estão conectadas àquelas que criam novas memórias. Mas o novo estudo começou com a hipótese de que partes do cérebro envolvidas em funções superiores também podem ter evoluído segundo o mesmo modelo básico, mesmo sem apresentar vínculo algum ao sentido do olfato. “Em outros mamíferos, o sentido do olfato, a inalação e o processamento de informações andam lado-a-lado” – disse Sobel. “Nossa hipótese assumia que não apenas o sistema olfativo, mas todo o cérebro se prepara para o processamento de novas informações começando pela inalação. Acreditamos que nosso cérebro seja “farejador”.

Para testar sua hipótese, os pesquisadores projetaram um experimento em que poderiam medir o fluxo de ar passando pelas narinas dos pacientes, ao mesmo tempo apresentando a eles problemas para solucionarem. O experimento incluía problemas matemáticos, problemas de visualização espacial (em que a pessoa tinha de decidir se um desenho de uma figura tridimensional poderia existir na vida real) e testes verbais (em que a pessoa decidia se as palavras que surgiam na tela eram reais ou não). Os pacientes tinham de clicar em um botão – uma vez quando respondiam a uma pergunta e uma vez quando estivessem prontos para a próxima pergunta. Os pesquisadores observaram que, à medida que os pacientes passavam pelos problemas, eles inalavam o ar logo antes de pressionar o botão, a cada pergunta.

O experimento foi projetado para que os pesquisadores tivessem a certeza de que os pacientes não estavam cientes do monitoramento de sua respiração, e eliminaram um cenário em que pressionar o botão era, em si, um motivo para inalar, e não o preparo para a tarefa em questão.

Em seguida, os pesquisadores alteravam o ambiente, oferecendo aos pacientes somente problemas espaciais para resolver, mas metade deles era apresentada no momento em que eles inalavam e a outra metade, quando exalavam. A inalação acabou se revelando significativamente associada aos resultados mais positivos nos problemas do teste. Durante o experimento, os pesquisadores mediram a atividade cerebral elétrica com um EEG, e também constataram a diferença entre a inalação e a exalação, particularmente no que diz respeito à conectividade entre diferentes partes do cérebro. O fato foi verdadeiro durante os períodos de descanso, além do período de solução de problemas, com maior conectividade associada à inalação. Além disto, quanto maior a lacuna entre os dois níveis de conectividade, mais a inalação parecia ajudar o paciente a solucionar os problemas.

“Pode-se deduzir que o cérebro associa a inalação à oxigenação, preparando-se assim para se concentrar melhor nas questões, mas os tempos medidos não correspondem a isto” – disse Sobel. “Tudo acontece em 200 milissegundos – muito antes que o oxigênio possa fluir dos pulmões ao cérebro. Os resultados comprovam que não só o sistema olfativo é sensível à inalação e à exalação, mas o cérebro inteiro também. Acreditamos que poderíamos generalizar e dizer que o cérebro funciona melhor durante a inalação”.

As constatações poderiam ajudar a explicar, entre outras coisas, por que o mundo parece difuso quando nosso nariz está entupido. Sobel indica que a própria palavra “inspiração” significa, além de respiração, também o estímulo ao intelecto e às emoções. E as pessoas que praticam meditação sabem que a respiração é fundamental para controlar as emoções e o pensamento. Entretanto, trata-se de um apoio empírico importante para as intuições, e demonstra que nosso sentido olfativo, de alguma forma, provavelmente forneceu o protótipo para a evolução do restante do cérebro.

Os cientistas acreditam que suas descobertas, entre outras cosias, poderão levar à pesquisa de métodos para ajudar crianças e adultos a se concentrar e controlar distúrbios, aprimorando suas habilidades por meio da respiração nasal controlada.

A pesquisa do Prof. Noam Sobel tem o apoio do Instituto Nacional Azrieli para Geração de Imagens e Pesquisa do Cérebro Humano; do Centro Norman e Helen Asher de Geração de Imagens do Cérebro Humano; do laboratório de Nadia Jaglom para Pesquisa de Neurobiologia do Olfato; da Fundação Adelis; do Fundo Rob e Cheryl McEwen para Pesquisa do Cérebro; e do Conselho Europeu de Pesquisa. O Prof. Sobel é o responsável pela cátedra de Neurobiologia Sara and Michael Sela.

As importinas da ansiedade

As importinas da ansiedade

O descobrimento de um novo mecanismo neural por trás da ansiedade aponta para possíveis tratamentos.

Segundo algumas estimativas, até uma em cada três pessoas em todo o mundo sofrem de ansiedade severa em suas vidas. Em um estudo publicado hoje na revista Cell Reports, pesquisadores do Instituto Weizmann de Ciências revelaram um mecanismo até então desconhecido por trás da ansiedade. Tentar entender essa trajetória bioquímica pode ajudar a desenvolver novas terapias para aliviar os sintomas de ansiedade.

 

“Os medicamentos atuais contra a ansiedade têm eficácia limitada ou efeitos colaterais indesejáveis, o que também limita sua utilidade. Nossas constatações poderão ajudar a superar essas limitações. Em uma pesquisa subsequente, já identificamos uma série de candidatos a medicamentos cujo alvo são as vias recentemente descobertas.”

Prof. Mike Fainzilber
Departamento de Ciências Biomoleculares
Instituto Weizmann de Ciências

 

O laboratório do Prof. Mike Fainzilber no Departamento de Ciências Biomoleculares do Instituto estudou por cerca de duas décadas as funções neuronais das proteínas conhecidas como importinas. Essas proteínas, encontradas em todas as células, transportam moléculas para o núcleo. O trabalho anterior do laboratório concentrou-se no sistema nervoso periférico (todos os tecidos nervosos no organismo, exceto o cérebro e a espinha dorsal). O estudante de pós-doutorado Dr. Nicolas Panayotis, que se juntou ao grupo em 2012, decidiu descobrir se algumas importinas também desempenham uma função no sistema nervoso central, ou seja, no cérebro e na espinha dorsal.

Panayotis e seus colegas estudaram cinco castas de camundongos, modificados por engenharia genética no laboratório do Prof. Michael Bader no centro de medicina molecular Max Delbrück em Berlim, eliminando genes da subfamília alfa de importinas. Os pesquisadores submeteram esses camundongos a uma bateria de ensaios comportamentais e descobriram que uma das castas – a que não expressava importinas alfa-5 – se destacava de forma exclusiva: Esses camundongos não demonstravam ansiedade em situações de estresse, ao serem deixados em grandes áreas expostas ou em uma plataforma muito elevada e aberta.

Os pesquisadores verificaram então como esses camundongos “mais calmos” se diferenciavam dos demais em termos de expressão genética em determinadas regiões do cérebro envolvidas no controle da ansiedade. Análises computadorizadas indicaram o MeCP2, um gene regulador que sabidamente afeta comportamentos de ansiedade. Constatou-se então que a importina alfa-5 era crítica para permitir a entrada do MeCP2 no núcleo dos neurônios. Mudanças nos níveis de MeCP2 no núcleo, por sua vez, afetaram os níveis de uma enzima envolvida na produção de uma molécula sinalizadora, conhecida como S1P. Nos camundongos sem a importina alfa-5, o MeCP2 não era capaz de entrar no núcleo dos neurônios controladores da ansiedade, reduzindo assim a sinalização da S1P e a ansiedade por conseguinte.

Na esquerda, neurônios do cérebro de camundongo normal onde a molécula MeCP2 (vermelha), relacionada a comportamento ansioso ingressa no núcleo (azul) dos neurônios. A direita, em camundongo geneticamente modificado sem a proteína importina alfa 5, a molécula MeCP2 (vermelha), relacionada a comportamento ansioso permanece fora do núcleo (azul) dos neurônios.

 

Após a realização de experimentos adicionais para confirmar que haviam de fato descoberto um novo mecanismo regulador da ansiedade no cérebro, os pesquisadores passaram a buscar moléculas que pudessem modificar esse mecanismo. Eles chegaram à conclusão de que já existem medicamentos que modulam a sinalização da S1P; um desses compostos, a fingolimode, é utilizado para tratar diversos tipos de esclerose. Quando os pesquisadores testaram os efeitos da fingolimode em camundongos normais, as cobaias demonstraram níveis mais baixos de ansiedade, semelhantes aos dos camundongos modificados geneticamente para eliminar o gene da importina alfa-5. Além disto, os pesquisadores encontraram um relato mais antigo, de um experimento clínico com fingolimode, segundo o qual o medicamento exercia um efeito calmante em pacientes com esclerose múltipla. O novo estudo poderá agora ajudar a explicar por que isto acontecia.

“Nossas constatações abriram um novo caminho para a pesquisa dos mecanismos da
ansiedade” – disse Panayotis. “Se compreendermos exatamente como a via que descobrimos controla a ansiedade, isto poderá nos ajudar a desenvolver novos medicamentos, ou a direcionar a utilização dos que já estão disponíveis, para aliviar os sintomas.”

Fainzilber: “Os medicamentos atuais contra a ansiedade têm eficácia limitada ou efeitos
colaterais indesejáveis, o que também limita sua utilidade. Nossas constatações poderão
ajudar a superar essas limitações. Em uma pesquisa subsequente, já identificamos uma série de candidatos a medicamentos cujo alvo são as vias recentemente descobertas.”

As constatações do estudo também representam uma nova luz sobre distúrbios genéticos
raros, caracterizados por mutações no gene MeCP2: A síndrome de Rett e a síndrome de
duplicação de MeCP2. Ambas são caracterizadas pela ansiedade, entre outros sintomas. A
identificação precisa do mecanismo responsável pela entrada de MeCP2 no núcleo dos
neurônios poderá, futuramente, ajudar a desenvolver terapias para essas doenças.

Participaram dessa pesquisa: Dr. Shachar Y. Dagan, Anna Meshcheriakova, Dr. Sandip Koley, Dra. Letizia Marvaldi, Didi-Andreas Song and Prof. Eitan Reuveny do Departamento de Ciências Biomoleculares do Instituto Weizmann; Dr. Anton Sheinin da Universidade de Tel Aviv; Prof. Izhak Michaelevski da Universidade de Ariel; Dr. Michael M. Tsoory do Departamento de Recursos Veterinários do Instituto Weizmann; Dra. Franziska Rother, Prof. Enno Hartmann e Prof. Michael Bader do Centro de Medicina Molecular Max Delbrück em Berlim, Alemanha; Dr. Mayur Vadhvani e Profa. Britta Eickholt da Charité Universitätsmedizin, também em Berlim.

A pesquisa do Prof. Michael Fainzilber tem o apoio do Laboratório Laraine e Alan A. Fischer de Espectrometria de Massa Biológica; da Fundação de Pesquisa Médica da Dra. Miriam e Sheldon G. Adelson; o Programa Zuckerman de Liderança em STEM; a Fundação Rising Tide; Sr. e Sra. Lawrence Feis; o espólio de Florence e Charles Cuevas; o espólio de Lilly Fulop; e o Conselho Europeu de Pesquisa. O Prof. Fainzilber é o titular da cadeira professoral de neurociências moleculares de Chaya.