Melatonina: novo conhecimento sobre este hormônio pode melhorar os transplantes de medula óssea

Melatonina: novo conhecimento sobre este hormônio pode melhorar os transplantes de medula óssea

 

Cientistas brasileiros e israelenses revelaram um relógio natural regulando a produção de células sanguíneas. A descoberta pode melhorar o tratamento
do câncer. O pesquisador do Instituto Weizmann de Ciências Prof. Tsvee Lapidot esteve esta semana na USP com a coautora, Profa. Regina Markus.

 

O transplante de medula óssea é um tratamento habitual do câncer e
outras doenças. Uma nova descoberta de cientistas do Instituto Weizmann
de Ciências (Israel) e da Universidade de São Paulo (USP), fruto do Projeto
de Cooperação Internacional FAPESP – Weizmann*, acaba de ser
publicada na prestigiosa revista Cell – Stem Cell. O avanço sugere que
ajustando o horário da colheita de células-tronco do doador aos ciclos dia
– noite (circadianos) o sucesso dos transplantes de medula óssea poderá
aumentar. “Nossos resultados sugerem que o horário da colheita das
células tronco pode afetar o sucesso do transplante de medula óssea”, diz
a pesquisadora Dra. Karin Golan. Os achados do estudo realizado
em camundongos  sugerem que em seres humanos também seria
possível aumentar o sucesso dos transplantes, realizando nos doadores de
medula um pré-tratamento com melatonina ou outras moléculas
reguladoras dos ciclos de luz e escuridão.

Ciclo diário

O Prof. Tsvee Lapidot, do Departamento de Imunologia, do Instituto
Weizmann de Ciências, em colaboração com a equipe da Profa. Regina
Markus, do Laboratório de Cronofarmacología da Universidade de São Paulo
(USP), e cientistas de outros países, descobriram que na medula óssea as
células formadoras de sangue se comportam de uma forma pela manhã, e de
forma diferente à noite. Eles revelaram que havia um relógio regulando a
produção de células sanguíneas.

O processo pelo qual se reabastece o sangue do corpo diariamente
envolve dois grupos de células da medula chamadas de células tronco
hematopoiéticas, umas já maduras, de vida curta, e um pool de células-
tronco imaturas.

No início, os pesquisadores determinaram a quantidade de células-
tronco na medula de camundongos ao longo de 24 horas e descobriram que
existem dois picos na produção destas células: às 11 da manhã e às 11 da
noite. Mas a descoberta foi além. As células não eram iguais. Durante o pico
de luz matinal, as células estavam amadurecendo e se diferenciando em
diferentes tipos de células necessárias para reabastecer o sangue e a saída
das células para a circulação era facilitada. Ao contrário, durante o pico
noturno, uma população maior de células na medula óssea adquiriu
características de células-tronco indiferenciadas, isto é, não especializadas.
No processo de passar de uma para outra havia influência do ciclo diário de
luz e escuridão.

Quando as células-tronco da noite foram transplantadas, em
camundongos, foram duas vezes mais eficientes do que com as células
colhidas durante o pico matinal. Houve também outras mudanças.
Dependendo do horário e da exposição à luz, os camundongos apresentaram
um aumento ou diminuição dos níveis de duas substâncias em sua medula
óssea: a norepinefrina (NE) e o fator de necrose tumoral (TNF), conhecida
por causar morte celular e inflamação. Quando os cientistas bloquearam
estas moléculas (ou realizaram experiências em camundongos
geneticamente modificados que não apresentam estas moléculas) os picos
de células-tronco deixaram de existir, sugerindo que essas moléculas são
essenciais para o ciclo que produz, alternativamente, células indiferenciadas
e maduras. “Descobrimos um mecanismo previamente desconhecido através
do qual as células-tronco são reabastecidas na medula óssea”, disse o prof.
Lapidot.

Revertendo os picos com a melatonina

Os cientistas foram além: descobriram que poderiam reverter os picos
através do emprego da melatonina. Quando injetaram este hormônio nos
camundongos, o típico pico noturno com grandes números de células tronco
indiferenciadas foi produzido pela manhã. “Atualmente, considerar as
alternâncias impostas pelas fases do dia no funcionamento normal dos seres
vivos permite uma enorme melhoria no entendimento de patologias e
também na determinação da melhor hora para tomada de medicamentos.
Neste projeto fomos além, este novo conhecimento permitirá realizar
procedimentos de alta complexidade em horários adequados”, diz a professora Dra Regina Markus.

 

*O Prof. Lapidot visitou o Brasil no ano 2013, e numa palestra organizada pelos Amigos do
Weizmann Brasil conheceu a Profa. Regina P. Markus. Ali se iniciou a parceria científica
e a colaboração internacional hoje apoiada pela FAPESP e pelo Weizmann.

A Profa. Markus e o Prof. Lapidot receberam o apoio de FAPESP-Weizmann. O aporte econômico da parte da Regina Markus foi financiada pela FAPESP e a do Prof. Lapidot pelo Instituto Weizmann de Ciências.

 

 

Este estudo foi realizado em colaboração com o Prof. John Dick, da University Health Network de Toronto no Canadá; Profa. Irit Sagi do Departamento de Regulação Biológica do Instituto Weizmann; e Prof. Steffen Jung e Dra. Biana Bernshtein do Departamento de Imunologia do Instituto Weizmann.

As pesquisas do Prof. Tsvee Lapidot são patrocinadas pelo Instituto para a Pesquisa com Células-Tronco Helen e Martin Kemmel, que ele dirige; Fundo de Pesquisas de Células -Tronco Dra. Beth Rom-Rymer; Prêmio Henri Grurwitz; Fundo de Patrocínio para Pesquisas com Células- Tronco Felix e Silvia Schnur; Asher Pertman e Wayne Pertman.

O Prof. Lapidot é o ocupante da Cátedra de Ensino e Pesquisa em Células-Tronco Edith Arnoff Stein.