Science Tips 100 – Humano demais

Humano demais

O preço que pagamos pelo nosso cérebro avançado pode ser uma tendência maior aos transtornos

As alternativas conscientes no cérebro humano (superior) e do cérebro do macaco (inferior). Quanto mais avançada em termos de evolução, mais eficiente e menos robusta cada

O Prof. Rony Paz do Instituto Weizmann de Ciências sugere que nosso cérebro é como uma máquina de lavar moderna: evoluiu para ter uma programação sofisticada, de última geração, mas ficou mais vulnerável à degeneração e suscetível a desenvolver transtornos penosos. Ele e um grupo de pesquisadores conduziram recentemente um experimento comparando a eficiência do código neural em primatas humanos e não-
humanos, e constataram que, à medida que o código neural se torna mais eficiente, a robustez que impede os erros é reduzida. Suas constatações, recentemente publicadas na revista Cell, podem ajudar a explicar por que transtornos como o TDAH, a ansiedade, a depressão, TEPT e até mesmo o autismo são comuns entre os seres humanos.

As alternativas conscientes no cérebro humano (superior) e do cérebro do macaco (inferior). Quanto mais avançada em termos de evolução, mais eficiente e menos robusta cada área comprovou ser Paz, do Departamento de Neurobiologia do Instituto, diz que a diferença anatômica entre seres humanos e outros primatas foi descrita – particularmente nosso grande córtex pré-frontal e o grande número de neurônios que contém. Mas as diferenças no código neural – o “software”, em contraste com o “hardware” (a estrutura física) – não foram exploradas.

Raviv Pryluk, estudante do grupo de Paz, desenvolveu uma maneira de testar e comparar a eficiência do código neural em diversas regiões do cérebro. “Definimos a comunicação eficiente como a que utiliza menos energia para transmitir o máximo de informações para transmitir uma mensagem tão complicada quanto possível com o mínimo possível de “palavras” – disse Pryluk.

Os pesquisadores registraram a atividade elétrica de neurônios isolados, tanto em seres humanos quanto em macacos do gênero macaca em duas regiões: o córtex pré-frontal, onde as funções mais avançadas, como o processo decisório e o raciocínio lógico, ocorrem e a amígdala, uma região mais antiga, que sofreu evolução mais expressiva, e que é responsável pelas funções básicas de sobrevivência, do tipo “lutar ou fugir”, além das emoções. Paz e seu grupo trabalharam em colaboração com o Prof. Itzhak Fried do Centro Médico de Sourasky em Tel Aviv e com a Faculdade de Medicina da UCLA em Los Angeles. Pacientes com epilepsia farmacologicamente não sujeita a tratamento se apresentaram a Fried para se submeterem à implantes de eletrodos para fins de diagnose, e proporcionaram uma rara oportunidade de registrar a atividade elétrica de neurônios isolados no cérebro humano. Também participaram dessa pesquisa a Dra. Hagar Gelbard-Sagiv da Universidade de Tel Aviv e o Dr. Yoav Kfir, estudante do grupo de Paz na época.

As constatações dessa pesquisa substanciaram a teoria da “máquina de lavar” da evolução do cérebro: O código neural no córtex pré-frontal “mais evoluído” é mais eficiente do que o da amígdala, tanto nos seres humanos quanto nos macacos. E o código neural de ambas as áreas no cérebro humano foram mais eficientes do que no macaco. Porém, quanto maior a eficiência de um código neural específico, menos imune ele será a cometer erros. Paz equipara a amígdala ao tambor de uma máquina de lavar: “Não se trata de um recurso altamente sofisticado, mas tem menor probabilidade de cometer falhas – um aspecto importante da sobrevivência dos animais” – disse ele, e acrescentou: “A resistência mais baixa da amígdala humana contra erros pode desempenhar um papel nas reações exageradas para sobrevivência em contextos inadequados, como os que vemos no TEPT e em outros transtornos de ansiedade”.

Pryluk: “A evolução funciona com alternativas conscientes. Pode haver uma relação de soma zero entre a eficiência e a robustez; e nosso cérebro complexo e multidimensional ganhou uma delas às custas da outra”.

Fried: “Comparar os registros de células isoladas de cérebros de seres humanos e de macacos é um grande passo para responder à pergunta ‘o que torna o cérebro humano tão exclusivo’. Paz acrescenta: “Por que, por um lado, os seres humanos têm uma capacidade de aprendizagem, capacidade cognitiva e de adaptação tão superiores e, por outro, essa tendência à ansiedade, à depressão e a outras neuroses? Demonstramos que esses podem ser dois lados de uma mesma moeda”.

A pesquisa do Prof. Rony Paz tem o apoio da Fundação Adelis; do Fundo de Incentivo às Descobertas da Família de Irving e Dorothy Rom; do Fundo Irving B. Harris para Novas Direções na Pesquisa do Cérebro; da Fundação da Família de Bernard e Norton Wolf; da Família Leff; da Fundação da Família Oster; do Sr. e Sra. Gary Clayman; de Rosanne Cohen; do Espólio de Toby Bieber; e do Conselho Europeu de Pesquisa.