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Science Tips 100 – Humano demais

Humano demais

O preço que pagamos pelo nosso cérebro avançado pode ser uma tendência maior aos transtornos

As alternativas conscientes no cérebro humano (superior) e do cérebro do macaco (inferior). Quanto mais avançada em termos de evolução, mais eficiente e menos robusta cada

O Prof. Rony Paz do Instituto Weizmann de Ciências sugere que nosso cérebro é como uma máquina de lavar moderna: evoluiu para ter uma programação sofisticada, de última geração, mas ficou mais vulnerável à degeneração e suscetível a desenvolver transtornos penosos. Ele e um grupo de pesquisadores conduziram recentemente um experimento comparando a eficiência do código neural em primatas humanos e não-
humanos, e constataram que, à medida que o código neural se torna mais eficiente, a robustez que impede os erros é reduzida. Suas constatações, recentemente publicadas na revista Cell, podem ajudar a explicar por que transtornos como o TDAH, a ansiedade, a depressão, TEPT e até mesmo o autismo são comuns entre os seres humanos.

As alternativas conscientes no cérebro humano (superior) e do cérebro do macaco (inferior). Quanto mais avançada em termos de evolução, mais eficiente e menos robusta cada área comprovou ser Paz, do Departamento de Neurobiologia do Instituto, diz que a diferença anatômica entre seres humanos e outros primatas foi descrita – particularmente nosso grande córtex pré-frontal e o grande número de neurônios que contém. Mas as diferenças no código neural – o “software”, em contraste com o “hardware” (a estrutura física) – não foram exploradas.

Raviv Pryluk, estudante do grupo de Paz, desenvolveu uma maneira de testar e comparar a eficiência do código neural em diversas regiões do cérebro. “Definimos a comunicação eficiente como a que utiliza menos energia para transmitir o máximo de informações para transmitir uma mensagem tão complicada quanto possível com o mínimo possível de “palavras” – disse Pryluk.

Os pesquisadores registraram a atividade elétrica de neurônios isolados, tanto em seres humanos quanto em macacos do gênero macaca em duas regiões: o córtex pré-frontal, onde as funções mais avançadas, como o processo decisório e o raciocínio lógico, ocorrem e a amígdala, uma região mais antiga, que sofreu evolução mais expressiva, e que é responsável pelas funções básicas de sobrevivência, do tipo “lutar ou fugir”, além das emoções. Paz e seu grupo trabalharam em colaboração com o Prof. Itzhak Fried do Centro Médico de Sourasky em Tel Aviv e com a Faculdade de Medicina da UCLA em Los Angeles. Pacientes com epilepsia farmacologicamente não sujeita a tratamento se apresentaram a Fried para se submeterem à implantes de eletrodos para fins de diagnose, e proporcionaram uma rara oportunidade de registrar a atividade elétrica de neurônios isolados no cérebro humano. Também participaram dessa pesquisa a Dra. Hagar Gelbard-Sagiv da Universidade de Tel Aviv e o Dr. Yoav Kfir, estudante do grupo de Paz na época.

As constatações dessa pesquisa substanciaram a teoria da “máquina de lavar” da evolução do cérebro: O código neural no córtex pré-frontal “mais evoluído” é mais eficiente do que o da amígdala, tanto nos seres humanos quanto nos macacos. E o código neural de ambas as áreas no cérebro humano foram mais eficientes do que no macaco. Porém, quanto maior a eficiência de um código neural específico, menos imune ele será a cometer erros. Paz equipara a amígdala ao tambor de uma máquina de lavar: “Não se trata de um recurso altamente sofisticado, mas tem menor probabilidade de cometer falhas – um aspecto importante da sobrevivência dos animais” – disse ele, e acrescentou: “A resistência mais baixa da amígdala humana contra erros pode desempenhar um papel nas reações exageradas para sobrevivência em contextos inadequados, como os que vemos no TEPT e em outros transtornos de ansiedade”.

Pryluk: “A evolução funciona com alternativas conscientes. Pode haver uma relação de soma zero entre a eficiência e a robustez; e nosso cérebro complexo e multidimensional ganhou uma delas às custas da outra”.

Fried: “Comparar os registros de células isoladas de cérebros de seres humanos e de macacos é um grande passo para responder à pergunta ‘o que torna o cérebro humano tão exclusivo’. Paz acrescenta: “Por que, por um lado, os seres humanos têm uma capacidade de aprendizagem, capacidade cognitiva e de adaptação tão superiores e, por outro, essa tendência à ansiedade, à depressão e a outras neuroses? Demonstramos que esses podem ser dois lados de uma mesma moeda”.

A pesquisa do Prof. Rony Paz tem o apoio da Fundação Adelis; do Fundo de Incentivo às Descobertas da Família de Irving e Dorothy Rom; do Fundo Irving B. Harris para Novas Direções na Pesquisa do Cérebro; da Fundação da Família de Bernard e Norton Wolf; da Família Leff; da Fundação da Família Oster; do Sr. e Sra. Gary Clayman; de Rosanne Cohen; do Espólio de Toby Bieber; e do Conselho Europeu de Pesquisa.

Science Tips 100 – As plantas piscam: Procedendo com cautela na luz solar

As plantas piscam: Procedendo com cautela na luz solar

Assim como os olhos se ajustam às mudanças de claridade, as plantas contam com mecanismos sensíveis que protegem suas folhas de mudanças rápidas na radiação

As plantes dispõem de mecanismos de controle que lembram os sentidos do ser humano. Segundo um novo estudo do Instituto Weizmann de Ciências, as plantas ajustam sua fotossíntese às mudanças rápidas de claridade, utilizando um sistema sofisticado de sensores , muito semelhante à forma como o olho humano reage às variações da claridade. Essa regulagem semelhante aos recursos sensoriais, funciona com baixas intensidades de luz, quando os mecanismos de fotossíntese são mais eficientes, mas também ficam mais vulneráveis a aumentos repentinos da claridade.
Uma visão amplamente aceita é a de que, como a planta tem mais energia para o seu crescimento na mesma proporção da quantidade de luz solar que ela absorve, a fotossíntese tende a acelerar proporcionalmente à intensidade da luz solar. Somente quando atinge um nível em que a radiação excessiva causa “queimaduras de sol” nocivas, a planta ativaria seus mecanismo de reparação e reduziria o ritmo da fotossíntese. O Prof. Avihai Danon, do Departamento de Ciências Botânicas e Ambientais e seus colegas avaliaram a fluorescência das plantas (luz reemitida por fotossíntese não produtiva, utilizada como intermediário não intrusivo para medir os níveis de fotossíntese) sob baixa exposição à luz, e se surpreenderam ao perceberem um padrão de “vaivém”.

Danon começou a trabalhar em colaboração com o Prof. Uri Alon do Departamento de Biologia Celular e Molecular, cujo laboratório estuda as redes e circuitos biológicos, entre os quais, os do corpo humano. A equipe – Avichai Tendler (do laboratório de Alon) e os Drs. Bat Chen Wolf e Vivekanand Tiwari (do laboratório de Danon) – expuseram espécimes de Arabidopsis thaliana, plantas-modelo da família da mostarda, a uma série de gradações de luminosidade, passo a passo, de dez minutos cada, na faixa baixa a moderara, mais ou menos equivalente à luz matinal – ou seja, abaixo do nível que causaria estresse nas plantas.

Conforme publicado na revista iScience, os cientistas perceberam que a fluorescência, em vez de se elevar de forma estável quando a luminosidade aumentava, apresentava um breve pico a cada gradação, e em seguida voltava ao nível inicial. A cada medição, o pico era inferior ao da etapa anterior. Isto ocorreu porque, segundo constataram os pesquisadores, quando a luz aumentava, menos fótons chegavam ao centro de reação fotossintética da planta do que se esperava devido à intensidade da luz. A cada gradação, os pesquisadores tinham de duplicar a intensidade da luz para produzir o mesmo pico de fluorescência da etapa anterior – padrão típico de mecanismos sensoriais em bactérias, animais e seres humanos.

Essas constatações comprovam que sob condições de luminosidade fraca, os mecanismos de controle da fotossíntese se parecem com os que funcionam em sistemas sensoriais como, por exemplo, a visão humana. Quando as pupilas se ajustam à claridade, esses ajustes não apenas protegem a retina, mas asseguram a
sensibilidade em relação aos arredores, apesar das alterações nas condições de luminosidade. Quando as pupilas se contraem, distinguimos apenas altos contrastes na iluminação. Em condições de baixa luminosidade, por exemplo, ao anoitecer, as pupilas se expandem, permitindo a entrada de mais luz e nos capacitando a identificar objetos que diferem uns dos outros apenas ligeiramente quanto estão refletindo a
luz. Da mesma forma, as antenas da fotossíntese – os complexos de moléculas de proteínas e clorofila que absorvem a luz nas plantas – se contraem contra a luz forte e se expandem sob condições de baixa luminosidade. Assim como ocorre com as pupilas, quando as antenas se expandem, elas absorvem a luz com maior eficiência e ficam mais sensíveis a pequenas variações na intensidade da luz – porém também se
tornam mais vulneráveis às mudanças, principalmente as mais repentinas.

“As plantas controlam a fotossíntese com cuidado, de forma que sacrificam a eficiência em curto prazo para o bem da estabilidade em longo prazo” – disse Danon. “De certa forma, os mecanismos da fotossíntese atuam como “sensores” do meio ambiente, fazendo ajustes rápidos conforme a quantidade de luz absorvida, antes que a situação saia do seu controle, em vez de lidar com a atividade de forma descontrolada e nociva”.

Os controles recém-descobertos agem com rapidez, ganhando tempo para que os mecanismos reguladores da fotossíntese, mais lentos, se adaptem às condições que surgirem. Esta primorosa estratégia de sobrevivência é uma das formas como as plantas aproveitam ao máximo a luz do sol sob condições de variação rápida ao ar
livre, por exemplo, quando nuvens passam, ou quando o vento altera o ângulo das folhas em relação à posição do sol.

O Prof. Avihai Danon é o titular da cátedra profissional de Henry e Bertha Benson.
A pesquisa do Prof. Uri Alon tem o apoio do Centro de Pesquisas em Biologia de Sistemas da Célula Humana da
Família Kahn; do Instituto Sagol de Pesquisa em Longevidade; do Centro Braginsky para a interface entre as
ciências exatas e humanas; o Programa Zuckerman de Liderança em STEM; da Fundação Rising Tide; do
Conselho Europeu de Pesquisa; e da Família Leff. O Prof. Alon é o titular da cátedra profissional de Abisch-
Frenkel.

Science Tips 100 – Cientistas israelenses e tchecos juntam forças pelo avanço da descoberta de medicamentos

Cientistas israelenses e tchecos juntam forças pelo avanço da descoberta de medicamentos

Para ampliar os laços entre as comunidades científicas de Israel e da República Tcheca, os países estão desenvolvendo novas formas de colaboração entre jovens cientistas talentosos. Um dos projetos dessa iniciativa é o da “Faculdades de Inverno Praga-Weizmann para a Descoberta de Medicamentos”. Essa semana intensiva de palestras profissionais conta com a presença de mais de 120 cientistas e estudantes de todo o mudo.

O projeto é uma oportunidade exclusiva para jovens pesquisadores israelenses e tchecos de se conhecerem e discutirem as últimas tendências e desafios do desenvolvimento de medicamentos, bem como de conhecer acadêmicos e especialistas renomados mundialmente, como os gigantes da indústria farmacêuticas como a MSD, a Roche e a Astra Zeneca.

A faculdade de inverno deste ano, organizada pelo Instituto de Química Orgânica e Bioquímica (Institute of Organic Chemistry and Biochemistry – IOCB) da Academia Tcheca de Ciências, a Universidade de Química e Tecnologia de Praga, e o Instituto Weizmann de Ciências, ocorreu pela primeira vez em Israel, no Instituto Weizmann, nos dias 3 a 7 de dezembro.

 

 

O Prof. Martin Fusek, Diretor adjunto do IOCB em Praga, um dos coorganizadores do evento, disse: “Depois de organizar quatro temporadas de faculdade de verão para o desenvolvimento de medicamentos, consecutivas e bem-sucedidas, o IOCB de Praga e a UCT de Praga foram procurados pela Profa. Irit Sagi, Decano da Faculdade de Feinberg do Instituto Weizmann, com uma proposta interessante de organizar uma faculdade anual de inverno em conjunto – a cada 2 anos em Praga, alternando com Rehovot. O que está acontecendo agora é a nossa primeira ramificação dessa nova tradição, e eu gostaria de agradecer meus colegas do Instituto Weizmann de Ciências, particularmente o Dr. Nir London e o Dr. Haim Barr, pela excelente organização e pela atmosfera altamente amigável. Estou muito satisfeito por poder me aprofundar na cooperação com essa organização de pesquisa de alto gabarito.

Entre os participantes do evento estavam o Embaixador tcheco em Israel, H. E. Martin Stopnický; o Prof. Karel Melzoch, Reitor da Universidade de Química e Tecnologia de Praga; o Dr. Zdeněk Hostomský, Diretor do IOCB em Praga; e o Dr. Jan Konvalinka, coorganizador e vice-reitor da Charles University.

Houve um tremendo interesse em participar, em todas as regiões de Israel, e a interação entre os cientistas israelenses e tchecos certamente renderá colaborações muito proveitosas. Tenho a expectativa de expandir o escopo dessa faculdade nos próximos anos – disse o coorganizador Dr. Nir London, do Instituto Weizmann.

O iniciativa e a conferência tiveram o apoio da Faculdade de Feinberg e de três faculdades de pesquisa: a Faculdade Solo Dwek e Maurizio Dwek de Pesquisa em Química; a Faculdade Ekard de Pesquisa em Ciências Biológicas; e a Faculdade Lorry I. Lokey de Pesquisa em Bioquímica.

Science Tips 99 – Metabolismo com nitrogênio alterado pode enfeitiçar o câncer

Metabolismo com nitrogênio alterado pode enfeitiçar o câncer

O Nitrogênio é um bloco de construção básico de todas as proteínas no corpo humano, no RNA e no DNA, de forma que os tumores cancerígenos são ávidos pelo elemento. Pesquisadores do Instituto Weizmann de Ciências, em colaboração com colegas do Instituto Nacional do Câncer (NCI) e de outras instituições, conseguiram demonstrar que em diversos tipos de câncer, o metabolismo do nitrogênio dos pacientes é alterado, produzindo alterações detectáveis nos fluidos corporais e contribuindo para o surgimento de novas mutações nos tecidos cancerosos. As constatações do estudo, publicadas recentemente na revista Cell, poderão facilitar a detecção precoce do câncer e a previsão dos resultados da imunoterapia no futuro.

Coloração no tecido de um fígado normal (linha superior, quatro imagens a partir da direita) revelam altos níveis de quatro enzimas do ciclo ureico diferentes (marrons ou marrons avermelhadas), enquanto as amostras de câncer hepático (linha inferior, quatro imagens a partir da direita) contém níveis baixos dessas enzimas. Em contraste, os marcadores do crescimento das células são baixos no tecido normal (linha superior, à esquerda) e extremamente altos no câncer hepático (linha inferior, à esquerda). Imagem gerada com o auxílio da Dra. Raya Eilam

Quando o corpo utiliza o nitrogênio, gera uma substância derivada dos seus resíduos chamada ureia, em uma cadeia de reações bioquímicas que ocorrem no fígado, conhecidas como ciclo ureico. Em decorrência desse ciclo, a ureia é expelida na corrente sanguínea e posteriormente transformada em excreção do organismo na urina. Em uma pesquisa anterior, a Dra. Ayelet Erez do Departamento de Regulação Biológica do Instituto Weizmann demonstrou que uma das enzimas do ciclo ureico foi desativada em diversos tumores cancerígenos, aumentando a disponibilidade de nitrogênio para a síntese de uma substância orgânica conhecida como pirimidina, que por sua vez, serve de apoio à síntese de RNA e DNA e ao desenvolvimento do câncer.

No novo estudo, conduzido com o auxílio do Prof. Eytan Ruppin do Instituto Nacional do Câncer e outros pesquisadores, a equipe de Erez identificou uma série de alterações definidas com precisão em enzimas adicionais do ciclo ureico, que atuam em conjunto aumentando a disponibilidade de compostos de nitrogênio para a síntese de pirimidina. Essas alterações causaram um aumento no nível de pirimidina no tumor e uma pré-disposição para mutações do câncer.

Quando os pesquisadores modificaram a expressão das enzimas do ciclo ureico em tumores de câncer no cólon em camundongos, verificaram que esses camundongos – ao contrário do que ocorreu no grupo de controle – apresentaram níveis mais baixos de ureia no sangue, além de níveis detectáveis de pirimidina na urina. Em seguida, os pesquisadores verificaram os prontuários médicos de 100 pacientes de câncer pediátrico em tratamento no Centro Médico Sourasky em Tel Aviv, para conferir seus níveis de ureia. “Descobrimos que, no dia da internação no hospital, as crianças com câncer tinham níveis significativamente reduzidos de ureia no sangue, em comparação aos níveis registrados de ureia em crianças saudáveis da mesma idade” – disse Erez.

Essas constatações sugerem que as disfunções no ciclo ureico no fígado e em tumores podem causar a geração de marcadores relativos ao nitrogênio que podem facilitar a detecção precoce do câncer. Futuros ensaios poderão se basear em uma pontuação que combina medições dos níveis de ureia no sangue e de pirimidina na urina, para gerar um alerta de que o câncer pode estar se desenvolvendo no organismo.

“Ensaios padrão de laboratório verificam níveis altos de ureia no sangue, mas agora estamos comprovando que níveis baixos também são sinal de problemas” – afirmou Erez. “As células cancerígenas não desperdiçam nada, e utilizam o nitrogênio ao máximo em vez de descartá-lo na forma de ureia como as células normais fazem”.

Além disto, depois de examinar dados genômicos de câncer, os pesquisadores descobriram que as disfunções no ciclo ureico predominam em diversos tipos de câncer, e que vem acompanhadas de mutações específicas que resultam do aumento na síntese de pirimidina.

Essas mutações associadas à pirimidina são uma faca de dois gumes. Por um lado, tornam o câncer mais agressivo, reduzindo o tempo de sobrevivência do paciente, e por outro, geram fragmentos de proteína que tornam o tumor mais ‘sensível” que o de costume, afetando seu impacto no sistema imunológico. Portanto, tumores com disfunções no ciclo ureico têm maior probabilidade de serem suscetíveis à imunoterapia, pois o sistema imunológico do próprio paciente se mobiliza para combater o tumor. Um análise de pacientes com melanoma de fato revelou que os que tinham tumores caracterizados por disfunções no ciclo ureico eram mais propensos a reagirem à imunoterapia do que os que não apresentavam essas características. Quando os pesquisadores induziram as referidas disfunções no ciclo ureico em camundongos com tumores cancerosos, eles descobriram que os camundongos reagiam com muito mais eficiência à imunoterapia do que os portadores de tumores com atividade intacta das mesmas enzimas.

Se essas descobertas forem confirmadas em estudos mais abrangentes em animais e seres humanos, poderão dar ensejo a testes que possam ajudar a avaliar as chances de sucesso da imunoterapia com base nas colorações detectadas nas biópsias, em vez de uma análise genômica, muito mais difícil de se realizar. As disfunções nos níveis de expressão das enzimas da ureia no tecido afetado pelos tumores sugerem que o paciente tem maior probabilidade de reagir à imunoterapia.

“Outra possibilidade que vale a pena ser explorada é se a manipulação genética do tumor para induzir esse tipo de disfunção antes da imunoterapia poderia aumentar a eficácia do tratamento” – disse Erez. Essa manipulação envolveria o rompimento deliberado do ciclo ureico do tumor, na esperança de que as disfunções causadas gerem mutações relacionadas à pirimidina nas proteínas, o que ajudaria o sistema imunológico a identificar e destruir o tumor.

Participantes do estudo: Dra. Lital Adler, Dra. Narin Carmel, Shiran Rabinovich, Dr. Rom Keshet, Dra. Noa Stettner, Dr. Alon Silberman, Hila Weiss e Sivan Pinto do Departamento de Regulação Biológica, Dra. Lilach Agemy e Prof. Avigdor Scherz do Departamento de Ciências Ambientais e Botânicas, Dra. Raya Eilam do Departamento de Recursos Veterinários, Drs. Alexander Brandis, Sergey Malitsky e Maxim Itkin do Departamento de Ciências da Vida, Shelly Kalaora, Dr. Ronen Levy e Profa. Yardena Samuels do Departamento de Biologia Celular e Molecular, e Dra. Noam Stern Ginossar do  Departamento de Genética Molecular – todos do Instituto Weizmann de Ciências; Dra. Joo Sang Lee, Hiren Karathia, Noam Auslander e Prof. Sridhar Hannenhalli da Universidade de Maryland; Daniel Helbling e Dr. David Dimmock da Faculdade de Medicina de Wisconsin; Dr. Qin Sol e Dr. Sandesh CS Nagamani da Faculdade Baylor de Medicina; Eilon Barnea e Prof. Arie Admon da Technion – Faculdade Israelense de Tecnologia; Miguel Unda e Prof. Arkaitz Carracedo do Hospital Universitário de Basurto em Bilbao, Espanha; Dr. David M Wilson III do Instituto Nacional do Envelhecimento; e Dr. Ronit Elhasid do Centro Médico de Sourasky, em Tel Aviv.

A pesquisa da Dra. Ayelet Erez tem o apoio da Fundação Adelis; da Fundação Rising Tide; do Consórcio da Família Comisaroff; do Fundo Irving B. Harris para Novos Direcionamentos em Pesquisas do Cérebro; e do Conselho Europeu de Pesquisa. A Dra. Erez é a encarregada da Cadeira de Desenvolvimento profissional Leah Omenn.  

 

Science Tips 99 – Um algoritmo capaz de rivalizar com especialistas pode salvar vidas

Um algoritmo capaz de rivalizar com especialistas pode salvar vidas

Um consórcio do Instituto Weizmann de Ciências e da Universidade de Nova York se classificou recentemente em primeiro lugar em uma competição de inovação em ecocardiografia


Os equipamentos de Ultrassom diminuíram, tanto no tamanho quanto no preço, nos últimos anos – tanto que se tornou padrão em hospitais e clínicas de todo o mundo. Hoje em dia, porém, o ultrassom exige especialistas altamente treinados para gerar as imagens e interpretar seus resultados, e isto dificultou seu uso em determinados estabelecimentos, como por exemplo, em prontos-socorros. Em um consórcio conhecido como On-Sight, cientistas de informática do Instituto Weizmann de Ciências e um cardiologista da Faculdade de Medicina da NYU, se reuniram para desenvolver um sistema automatizado que oriente o  operador ao gerar as imagens e em seguida interpretar com precisão os resultados para os médicos. Esse empreendimento foi premiado recentemente por ter ficado em terceiro lugar no desafio Echovation Challenge da Sociedade Americana de Ecocardiografia.

Um ecocardiograma é um tipo de ultrassom que mede a fração de ejeção do coração – ou seja, a fração do sangue na câmara esquerda do coração que é ejetada para o resto do corpo a cada batimento cardíaco.

É considerada a medição mais confiável das funções cardíacas e, se pudesse ser utilizado para diagnóstico imediato, o exame poderia salvar muitas vidas.

O prêmio de 2018 foi anunciado na convenção da Sociedade em Nashville. O On-Sight foi o selecionado entre mais de 30 outros concorrentes, porque seus resultados em tempo real podem ajudar os médicos − mesmo que não-especialistas ou residentes − fornecendo um diagnóstico rápido e confiável.

Para testar o sistema, o algoritmo do On-Sight disputou contra quatro especialistas em ecocardiografia a exatidão de suas análises de eletrocardiogramas de 114 pacientes, por comparação. Os resultados foram incríveis: As frações de ejeção calculadas pelo algoritmo foram tão próximas dos números reais dos corações dos pacientes quanto as dos médicos.

Técnicos experientes em ultrassom passam por horas de treinamento, anos de prática e reciclagem contínua. Como é possível ensinar a um computador como enxergar o mesmo que esses especialista enxergam? O algoritmo do On-Sight emprega a chamada rede neural central, baseada em inteligência artificial e aprendizagem de máquina por padrão geométrico. Esse tipo de sistema combina o método baseado em rede com que nossos cérebros absorvem as informações e as vinculam, à capacidade do computador de absorver rapidamente enormes volumes de informações e se concentrar em uma tarefa específica. O Prof. Yaron Lipman do Departamento de Ciência da Computação e Matemática Aplicada do Instituto Weizmann de Ciências é um especialista no novo campo de aprendizagem de máquina por padrão geométrico, que acrescenta camadas de complexidade às redes neurais da máquina. Desta forma, o diagnóstico “intuitivo” de vários especialistas são traduzidos em resultados mais definitivos de exames médicos.

A equipe do On-Sight também conta com Dr. Achi Ludomirsky, especialista em cardiologia pediátrica da Faculdade de Medicina da NYU, Itay Kezurer, cofundador e futuro diretor de tecnologia, e o Dr. Yoram Eshel, presidente da empresa.

O grupo optou pelo foco em ultrassom cardiológico porque um diagnóstico em tempo hábil representa um forte potencial de salvar vidas nessa área. Além das configurações para serviços de emergência e pronto-socorros, eles esperam que a tecnologia venha a ser utilizada em clínicas de repouso, clínicas esportivas e ambulâncias, bem como nos países em desenvolvimento.

A pesquisa do Prof. Yaron Lipman tem o apoio do Conselho Europeu de Pesquisa.

 

Science Tips 99 – Congelamento de ovos de moscas para o futuro

Congelamento de ovos de moscas para o futuro

O WISE, clube de empreendedorismo dos estudantes do Instituto Weizmann de Ciências, ajudou três ex-alunos a fundarem uma nova empresa para investir no mercado de insetos comestíveis.

As Moscas têm um forte teor de proteínas e gorduras alimentícias, crescem rapidamente e se alimentam de resíduos orgânicos. Uma mosca específica, a mosca soldado negra (Hermitia illucens), poderia representar uma fonte alternativa e sustentável de proteínas para alimentação de animais, e empresas de todo o mundo estão estudando essa possibilidade. A nova empresa fundada pelos três estudantes recém-formados pelo Instituto Weizmann de Ciências pretende investir no setor de insetos comestíveis, congelando os ovos dessas moscas para que os criadores possam planejar e controlar sua produtividade.

O interesse em insetos comestíveis tem crescido nos últimos anos, pois ficou claro que o atual uso de 80% das terras férteis do planeta para alimentar animais é insustentável. As moscas soldado negras são consideradas excelentes candidatas como fonte alternativa de proteínas, pois não picam nem transmitem doenças, e suas larvas crescem rapidamente multiplicando milhares de vezes o tamanho original, alimentadas apenas por resíduos orgânicos como cascas de frutas cítricas ou carne em putrefação. Quando se tornam adultas, as moscas podem ser trituradas e misturadas com farinha para formar um aditivo nutritivo para rações animais.

Os três novos cientistas do Instituto Weizmann de Ciências – Drs. Yuval Gilad, Idan Alyagor e Yoav Politi – batizaram sua empresa de FREEZEM. Como o nome sugere, estão desenvolvendo um método para congelar criogenicamente os ovos das moscas, mantendo sua viabilidade. A tecnologia de congelamento dos ovos, segundo os empreendedores, é diferente da utilizada para congelar óvulos humanos ou bactérias, e eles são os primeiros a oferecer essa técnica.

A ideia do congelamento dos ovos é dividir o ciclo de vida das moscas em duas etapas: Na primeira delas, a fase de reprodução e postura de ovos, e na outra, a fase de crescimento das larvas. Isto permitiria aos criadores se concentrar nos volumes, nas condições e nos prazos corretos para produzir lotes maiores de insetos. “Da mesma forma que os produtores rurais modernos compram suas sementes, os criadores de insetos comestíveis vão comprar ovos congelados, degelá-los e criar as larvas” – explicou Gilad. Estima-se que o mercado global de insetos comestíveis já movimente 100 milhões de dólares, mas o comércio de rações animais movimenta 400 bilhões de dólares. Isto significa que o mercado potencial para essa fonte alternativa e sustentável de proteínas de insetos é imenso. Os três fundadores da FREEZEM esperam que sua tecnologia se transforme no impulso necessário para tornar a criação de moscas eficiente, economicamente viável e competitiva nesse mercado.

A empresa foi projetada no WISe, o clube de empreendedorismo dos estudantes do Instituto Weizmann de Ciências. Gilad e Politi são amigos desde o jardim de infância; eles conheceram Alyagor no clube. Todos os três tinham planos de sair do mundo acadêmico direto para a indústria, e o WISe os ajudou promovendo reuniões com empreendedores e industriais, fornecendo as ferramentas para o desenvolvimento de um modelo empresarial e finalmente na fundação da empresa. Eles assinaram recentemente um contrato com a Yeda, empresa da área de transferência de tecnologia do Instituto Weizmann, e a Yeda também investiu na FREEZEM.

Science Tips 98 – Mudança de posição: a traição de um gene anti-câncer

Mudança de posição: a traição de um gene anti-câncer

Habitualmente, os generais de um exército não mudam de lado a meio de uma guerra, mas quando o câncer está sendo atacado, isso pode fazer com que um gene que atua como principal defensor do corpo se filie à oposição. Conforme recente- mente relatado em Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), investigadores do Instituto Weizmann de Ciência descobriram que a traição desse gene pode ocorrer de mais maneiras do que as consideradas anteriormente.

Os efeitos do p53 em fibroblastos associados ao câncer na migração de células cancerosas: As células cancerosas (magenta) migram na direção de fibroblastos associados ao câncer (amarelo) que expressam um gene de p53 não mutante (esquerda); essa migração é mais lenta (centro) quando o p53 nos fibroblastos é silenciado; quando as substâncias liberadas pelos fibroblastos associados ao câncer são adicionadas à placa de Petri, a migração é restaurada (direita)

Todas as células têm esse gene, conhecido como p53. Esse gene normalmente desempenha um papel central na proteção do corpo contra a malignidade, orquestrando as defesas da célula contra o câncer e frequentemente matando uma célula potencialmente cancerosa, caso elas falhem. Em cerca de metade de pacientes oncológicos, o gene p53 existente nas células cancerosas contêm alterações – mutações – que podem resultar na produção de uma proteína p53 que não só é incapaz de suprimir o câncer, mas que pode inclusive iniciar atividades que promovam o câncer.

Mas para além das células cancerosas, um tumor maligno contém diversas células não cancerosas e elementos de tecido conjuntivo, normalmente designados como “microambiente tumoral”. Nas fases iniciais do desenvolvimento do câncer, o microambiente é hostil ao tumor. O Prof. Moshe Oren, do Departamento de Biologia Celular e Molecular, e outros cientistas constataram em estudos anteriores que o p53 das células do microambiente contribui para esta hostilidade, ao bloquear a disseminação do câncer. “Normalmente essa campanha de proteção funciona, caso contrário as pessoas teriam câncer com muito mais frequência do que realmente têm”, disse Oren.

À medida que o câncer progride e se torna mais maligno, o microambiente tumoral muda gradualmente. Os cientistas se referem a esse processo como “educação”:  o tumor em desenvolvimento está assumindo o controle do microambiente, ensinando-o a promover o câncer, ao invés de restringi-lo.

Entre as células controladas estão os fibroblastos, que fornecem o “cimento” estrutural ao tecido. Inicialmente, elas ajudam a recrutar células imunes contra o câncer, mas depois começam a liberar substâncias que promovem o crescimento, a invasão e a sobrevivência do tumor. Nessa fase, essas células são chamadas “fibroblastos associados ao câncer”.

O novo estudo, realizado no laboratório de Oren em colaboração com colegas do Instituto Weizmann, mostra que a “educação” do microambiente – um termo mais apropriado seria provavelmente “lavagem cerebral” – é parcialmente direcionada ao p53 dos fibroblastos. À medida que o câncer cresce, o p53 nos fibroblastos muda de lado. Apesar de o p53 nos fibroblastos associados ao câncer não sofrer mutações tal como ocorre nas células cancerosas, mesmo assim é alterado de uma maneira que faz com que deixe de restringir e passe a apoiar o câncer.

No estudo, liderado pela investigadora pós-doutorada Dra. Sharatj Chandra Arandkar, em colaboração com o colega de departamento Prof. o Prof. Yosef Yarden e o Dr. Igor Ulitsky do Departamento de Regulação Biológica, os investigadores mostraram que a eliminação da proteína p53 dos fibroblastos associados ao câncer ao silenciar os genes do p53 fez com que essas células perdessem muitas das suas características de apoio ao tumor e se comportassem mais como fibroblastos normais. Particularmente, o silenciamento do p53 dos fibroblastos reduziu a migração de células cancerosas adjacentes em uma placa de Petri – uma mudança essencial, considerando que a migração invasiva facilita a disseminação metastática do câncer. Além disso, o silenciamento do p53 em fibroblastos associados ao câncer reduziu con- sideravelmente a capacidade dessas células de estimularem o crescimento do tumor em camundongos.

Os autores do estudo incluem os Drs. Noa Furth, Yair Elisha e Nishanth Belugali Nataraj do Weizmann, bem como do Instituto de Farmacologia Clínica Dr. Margarete Fischer-Bosch em Stuttgart, Alemanha: Prof. Walter Aulitzky e o Dr. Heiko van der Kuip, em memória do qual essa publicação foi dedicada.

Encontrar maneiras de “reeducar” o p53 traidor no microambiente tumoral – de forma a inverter o seu comportamento para que volte a suprimir tumores – poderá abrir caminho para o desenvolvimento de terapias originais direcionadas ao microambiente, ao invés das próprias células cancerosas. Na verdade, nos últimos anos estratégias direcionadas ao microambiente canceroso estão sendo cada vez mais exploradas. A esperança é de que possam fornecer uma nova janela de oportunidade para lançar uma terapia eficaz, pois o microambiente tende a evoluir mais devagar do que as células tumorais que apresentam mutações.

A investigação do Prof. Moshe Oren
é apoiada pelo Centro Integrado de Câncer Moross (Moross Integrated Cancer Center), do qual é presidente; Rising Tide; o Fundo Familiar Comis- aroff (Comisaroff Family Trust); a Fundação Pearl Welinsky Merlo (Pearl Welinsky Merlo Foundation); o Fundo de Investigação de Progresso Científico (Scientific Progress Research Fund); a Fundação de Investigação Médica Dr. Miriam and Sheldon G. Adelson (Dr. Miriam and Sheldon G. Adelson Medical Research Founda- tion); e o Fundo de Investigação sobre Câncer Joel e Mady Dukler (Joel and Mady Dukler Fund for Cancer Research). O Prof. Oren é o responsável pela Cadeira Professoral Andre Lwoff de Biologia Molecular.

 

Science Tips 98 – Um modelo centenário da origem da vida obtém evidências consideráveis

Um modelo centenário da origem da vida obtém evidências consideráveis

Em 1924, o bioquímico russo Alexander Oparin declarou que a vida na Terra se desenvolveu através de mudanças químicas graduais de moléculas orgânicas na “sopa primordial”, que provavelmente existiu na Terra há 4 bilhões de anos. Na perspectiva dele, a combinação complexa de moléculas sem vida, conjugando forças em pequenas gotículas oleosas, podia assumir capacidades de vida autorreprodução, seleção e evolução. Essas ideias foram recebidas com dúvidas significativas que permanecem até hoje.

Uma “caminhada” em espaço de composição de um conjunto molecular do mundo de lipídios, exibida em três dimensões simplificadas. Um ponto na linha significa uma composição específica ao longo do eixo do tempo, de acordo com o qual as três coordenadas são quantidades de três diferentes tipos de moléculas. Um compossoma (fundo rosa) é um intervalo de tempo em que a composição permanece quase inal- terada, o que significa reprodução composicional.

Trinta anos depois, quando a estrutura do DNA foi decifrada, percebeu-se que essa molécula é capaz de realizar a autorreprodução, aparentemente solucionando o enigma da origem da vida sem recurso às gotículas de Oparin. Mas os críticos argumentaram que a vida exige não apenas replicadores, como também catalisadores enzimáticos para controlar o metabolismo. Decorreram mais 30 anos antes da descoberta de que o RNA, o principal componente na transferência de informação do DNA para proteínas, também pode ser uma enzima. Foi assim que nasceu o conceito de “Mundo de RNA”, de acordo com o qual a vida começou quando a sopa primordial originou uma ribozima, que pode simultaneamente se reproduzir e controlar o metabolismo.

Apesar disso, as dúvidas permaneceram, pois um ribossomo com capacidade de reprodução é uma molécula altamente complexa, com ínfima probabilidade de aparição espontânea na sopa. Isso conduziu
a um conceito alternativo – redes mutuamente catalisadoras, capazes de copiar conjuntos moleculares completos. Essa ideia reflete a combinação complexa em evolução de moléculas simples de Oparin, cada uma com alta probabilidade de surgir na sopa. Faltava gerar um modelo químico detalhado que ajudasse a fundamentar a narrativa.
O Prof. Doron Lancet e seus colegas do Departamento de Genética Molecular (Dept. of Molecular Genetics) do Instituto Weizmann de Ciência criaram esse modelo. Primeiro, foi necessário identificar
o tipo de moléculas apropriado que possa agregar e efetivamente formar redes de interações mútuas, em linha com as gotículas de Oparin. Lancet propôs lipídios, compostos oleosos que formam espontaneamente as membranas agregadas que delimitam todas as células vivas. Bolhas de lipídios (vesículas) podem crescer e se dividir tal como células vivas. Foi assim que Lancet gerou o conceito de “Mundo de lipídios” há duas décadas.
Para analisar as redes moleculares designadas, eles usaram ferramentas de biologia de sistemas e química computacional que permitiram incutir rigor no conceito um tanto efêmero de redes mutuamente catalisadoras.
Primeiro, abordaram em detalhe a pergunta importuna de como os conjuntos de lipídios podem armazenar e transmitir informação de uma geração que cresceu e se dividiu para outra. Encontraram uma noção raramente explorada até ao momento de que o que é transmitido são informações composicionais, e mostram como isso acontece através de simulações informáticas detalhadas. Além disso, indicaram uma semelhança profunda entre a cópia de composição e a maneira como as células vivas que crescem e proliferam preservam a sua informação epigenética, que depende da replicação do DNA.

Em um artigo recentemente publicado na Royal Society Interface, Lancet e seus colegas relataram uma análise sistemática da literatura, mostrando que os lipídios podem realizar catálise como as enzimas, de maneira semelhante aos ribossomos. Essa é uma propriedade fundamental para a formação das redes de interação mútua. Subsequentemente, os autores mostram, através do uso de ferramentas de biologia de sistemas e química computacional, que as gotículas oleosas podem acumular e armazenar informações composicionais e que, ao serem submetidas ao processo de fissão, transmitem a informação à descendência.
Com base no modelo informático que desenvolveram, os cientistas demonstraram que composições de lipídios específicas, designadas “compossomas”, podem sofrer mutações na sua composição, ser sujeitas à seleção natural em resposta a mudanças ambientais e podem mesmo ser submetidas à seleção darwiniana. O Prof. Lancet comenta que esse sistema de informação, baseado em composições e não na sequência de “letras” químicas como o DNA, remonta ao domínio da epigenética, onde os traços são herdados de maneira independente da sequência de DNA. Isso confere credibilidade à suposição dos cientistas de que a vida poderia surgir antes da chegada do DNA e do RNA. Na realidade, eles retratam no artigo um caminho químico que conduz à aparição de material genético no contexto das gotículas oleosas.

O conceito de “Mundo de lipídios” de Lancet está associado à questão de ter havido ou não moléculas hidrofóbicas oleosas em quantidade suficiente na sopa primordial. Os cientistas também descrevem uma pesquisa literária exaustiva, de acordo com a qual existe uma elevada probabilidade de as moléculas estarem presentes no período inicial da Terra. Essa conclusão foi apoiada por um estudo muito recente que mostra que Encélado, uma das luas de Saturno, tem um oceano subglacial (oceano primordial) repleto com compostos hidrofóbicos, alguns dos quais poderiam formar gotículas semelhantes às do “Mundo de lipídios”. O Prof. Lancet afirma que essas constatações, juntamente com cálculos baseados em modelos inovadores, mostram que a probabilidade do surgimento da vida é relativamente alta, inclusive a possibilidade empolgante de que a Encélado abriga atualmente algumas formas de vida primárias baseadas em lipídios.

 

O Prof. Lancet é responsável pela Cadeira Professoral Ralph D. e Lois R. Silver de Genômica Humana.

Science Tips 98 – Abordagem combinada oferece esperança a pacientes com câncer de pulmão

Abordagem combinada oferece esperança a pacientes com câncer de pulmão que desenvolvam resistência a medicamentos

O câncer de pulmão é a causa mais comum de morte por malignidade, o que corresponde aproximadamente a um quinto das mortes por câncer em todo o mundo, segundo a estimativa da Organização Mundial da Saúde. Os novos medicamentos tratam subtipos específicos desse câncer ao serem direcionados para as mutações genéticas características de cada subtipo.

Resposta ao tratamento em células cancerosas: A abundância de receptores de EGFR (linha superior) e HER2 (linha inferior) é reduzida quando as células são expostas à terapia tripla – Tagrisso, Erbitux e Herceptin (coluna à direita) e aos dois anticorpos, Erbitux e Herceptin (se- gundo a partir da coluna à direita), mas não quando são expostas apenas ao Tagrisso (segunda coluna a partir da esquerda) ou a nenhuma terapia (coluna à esquerda).

Em média, em cerca de 12% dos pacientes com câncer de pulmão – a maioria não fumadora – a malignidade resulta de uma mutação em um gene designado EGFR. Esse gene codifica um receptor localizado na membrana celular. A “cabeça”, a parte exterior na superfície celular, se liga a um fator de crescimento que transmite um sinal de crescimento à célula; as “pernas”, a parte localizada no interior da célula, funciona como uma enzima que transmite o sinal ao núcleo celular. A mensagem de crescimento do EGFR estimula a divisão celular, o que normalmente atende a uma finalidade desejável – por exemplo, ajudar tecidos a cicatrizar – mas uma mutação na parte interna do receptor pode provocar a divisão descontrolada da célula, originando câncer.

É possível ajudar pacientes com a mutação do EGFR por meio de pequenas moléculas conhecidas como inibidores da quinase, que bloqueiam a mutação, impedindo que o EGFR gere um sinal de divisão descontrolada. Esses medicamentos funcionam muito melhor do que a quimioterapia: são mais eficazes e causam menos efeitos secundários, e podem ser tomados em comprimidos ao invés de injeções. O problema é que, em aproximadamente 10 a 14 meses, muitos dos pacientes desenvolvem uma mutação secundária no EGFR. Isso causa a recidiva dos tumores, pois permite que o EGFR contorne o inibidor da quinase.

Em 2015, um novo inibidor de quinase conhecido pelo nome comercial Tagrisso, que bloqueia essa secunda mutação, foi aprovado para uso clínico nos casos em que o tumor de pulmão cresce novamente.

O Tagrisso ajuda, mas geralmente não por muito tempo. De novo, em aproximadamente 10 a 14 meses, uma terceira mutação ou outras alterações surgem no gene EGFR, causando outra recidiva.

“Isso, claro, é um pesadelo para os pacientes, suas famílias e médicos”, afirma o Prof. Yosef Yarden, do Departamento de Regulação Biológica. “Desenvolvemos uma nova abordagem que funciona em camundongo e pode ajudar a aliviar essa situação frustrante caso seja comprovado que o nosso método funcione em humanos.”

Em colaboração com médicos do Centro Médico Chaim Sheba em Tel Hashomer, Israel, a equipe de Yarden experimentou uma terapia combinada. Foi administrado Tagrisso e um medicamento que bloqueia o EGFR na superfície celular a camundongos implantados com células de câncer de pulmão humanas. Esse medicamento foi o Erbitux, um anticorpo que se liga à parte exterior do EGFR, impedindo que a célula receba a mensagem de crescimento. O Tagrisso que os camundongos receberam funciona dentro da célula, impedindo que a parte interna do EGFR, a quinase estimuladora do crescimento, retransmita o sinal de crescimento.

Essa tentativa original de uma terapia combinada tinha sido malsucedida, provavelmente porque quando o EGFR é bloqueado na superfície da célula, ele chama um “parente” próximo, um receptor chamado HER2, para surgir na membrana celular. Portanto, no novo estudo, os pesquisadores administraram aos camundongos uma terapia combinada tripla que, além do Tagrisso, incluía dois anticorpos ao invés de um: o Erbitux e um medicamento chamado Herceptin, que bloqueia o HER2.

Dessa vez, a abordagem funcionou. Os tumores reduziram consideravelmente e não cresceram novamente durante a administração do tratamento combinado triplo aos camundongos. O uso dessa abordagem em pacientes humanos deve ser facilitado pelo fato de ambos os anticorpos serem medicamentos já aprovados para uso contra outros cânceres: o Erbitux é usado no câncer colorretal e o Herceptin no câncer de mama.

“Caso seja confirmado em humanos, a nova terapia combinada pode ajudar a prolongar a vida de diversos milhares de pacientes com câncer de pulmão que atualmente desenvolvem resistência aos inibidores de quinase”, afirma Yarden.

A equipe de pesquisa incluiu a Dra. Donatella Romaniello, Luigi Mazzeo, Dr. Maicol Mancini, Dra. Ilaria Marrocco, Ashish Noronha, Matthew Kreitman, Dra. Swati Srivastava, Dra. Soma Ghosh e Dra. Moshit Lindzen do Departamento de Regulação Biológica, bem como o Dr. Tomer Meir Salame do Departamento de Ciências da Vida (Life Sciences Core Facilities Department). Os cientistas do Instituto Weizmann colaboraram com os Drs. Amir Onn e Jair Bar, médicos do Centro Médico Sheba.

 

A investigação do Prof. Yosef Yarden é apoiada pela Fundação de Investigação Médica Dra. Miriam e Sheldon G. Andelson (Dr. Miriam and Sheldon G. Andelson Medical Research Foundation); o Instituto de Pesquisa de Terapias para o Câncer Dwek (Dwek Institute for Cancer Therapy Research), presidida por ele; Rising Tide; o Laboratório de Pesquisa sobre Câncer Marvin Tanner (Marvin Tanner Laboratory for Research on Cancer; o Fundo Familiar Comisaroff (Comisaroff Family Trust); e o Conselho Europeu de Pesquisa (European Research Council). O Prof. Yarden é responsável pela Cadeira Professoral Harold e Zelda Goldenberg de Biologia Celular e Molecular.

 

Leia mais: A Combination Of Approved Antibodies Overcomes Resistance Of Lung Cancer To Osimertinib By Blocking Bypass Pathways

Science Tips 97 – Equipe XENON1T define limites

Esquerda: instalação do XENON1T; centro: dentro da blindagem de água; direita: parte do detector

Equipe XENON1T define limites

Investigadores do Weizmann participam da busca mais sensível por matéria escura até hoje

O Dr. Ran Budnik e sua equipe no Instituto Weizmann de Ciência se juntaram a 165 investigadores de 27 institutos de pesquisa ao redor do mundo que trabalham no experimento XENON1T. Este experimento é, de longe, o mais sensível em busca da matéria escura, e os resultados que eles relataram esta semana estabeleceram um limite rigoroso sobre a possível massa de partículas que podem compor a elusiva matéria escura.

Após esses resultados, com base num tanque contendo mais de uma tonelada de xenônio líquido e dados coletados em cerca de um ano, a equipe de pesquisa está planejando um experimento ainda maior e mais sensível – o XENONnT – para 2019.

Acredita-se que toda a matéria seja composta por 83% de matéria escura, mas é invisível para nós, pois não emite luz e a sua interação com a matéria comum é muito fraca.

Um dos candidatos para a matéria escura é um componente denomi- nado WIMPs (Weakly Interacting Massive Particles), que significa “partículas massivas que interagem fracamente”. O XENON1T tem estado na vanguarda da pesquisa por WIMPs. Num laboratório subterrâneo profundo no INFN Laboratori Nazionali del Gran Sasso, na Itália, o detector de xenônio espera por um sinal que relataria a interação de um WIMP com um átomo de xenônio. Isto seria um pequeno lampejo de luz de cintilação e um número reduzido de elétrons ionizados, que por sua vez emitem pequenos clarões.

Budnik e sua equipe do Departamento de Física de Partículas e Astrofísica (Particle Physics and Astrophysics Department) do Instituto trabalharam nos sistemas de controle do equipamento XENON1T, respectiva calibração, interpretação e análise estatística.

Desde o primeiro experimento, em 2005, a colaboração XENON aumentou a potencial massa alvo de 5 kg para 1300 kg, também reduzindo a interferência de fundo por um fator de 5000. A mais recente iteração aumentará quatro vezes o alvo, e também reduzirá a interferência de fundo novamente por um fator de dez. “Como a configuração do XENON1T é tão exata”, diz Budnik, “o fato de nenhum evento de fundo ter sido detectado na região mais pura do detector significa que agora podemos estabelecer um limite sobre as interações de WIMPs com a matéria comum. O novo detector nos permitirá procurar essas partículas em um intervalo que ainda não pode ser observado.”

Dr. Budnik ocupa a cadeira de desenvolvimento profissional Aryeh e Ido Dissentshik

Leia mais: Xenon1t